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dezembro 4, 2013

Instantâneos da mobilidade

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A dramática e conflituosa mobilidade dentro da cidade do Rio de Janeiro, que conta com aproximadamente 5.266 habitantes por km², já carrega em si uma motivação para um registro – seja ele da natureza que for. No caso deste ensaio, o meio escolhido foi a fotografia. Talvez ela seja a melhor ferramenta para congelar momentos que, de tão comuns, não são percebidos de forma integral e singular.

A dura realidade do transporte público na capital fluminense é velha conhecida de sua população: veículos desconfortáveis, ônibus que demoram a chegar no ponto de partida e também no destino final, integração intermodal ineficaz, entre outros. Todo este descompasso se mostra, de forma gritante e ao mesmo tempo calada, na expressão corporal dos usuários. São braços cruzados, um olhar para baixo ou para fora, ou um rosto franzido. Tudo indica que estas pessoas anseiam por não estarem ali e, já que estão, que esta passagem seja a mais rápida possível.

A fotografia também consegue captar a transformação dos indivíduos em um fluxo único, impessoal e homogêneo. Centrado em um único objetivo – a chegada mais rápida ao destino final – este fluxo caminha subjugado a meios que claramente deixam em suspenso a individualidade e o prazer destes usuários.

O Bilhete Único Carioca e a falta de unificação

Foto: Daiana PereiraA falta de integração do Bilhete Único Carioca parece não fazer jus a tantos projetos de mobilidade urbana anunciados para a cidade. O programa foi apresentado como uma linda promessa de campanha, feita em 2008, pelo então candidato e atual prefeito Eduardo Paes. Em suas constantes aparições, Paes dizia ser esta a solução para o problema do carioca em pagar duas passagens para chegar ao trabalho. Fato este que, por diversas vezes, foi motivo para a não contratação de profissionais que utilizavam dois transportes, devido ao alto custo no bolso dos patrões.

Segundo a promessa, o bilhete seria aceito em todos os transportes coletivos, incluindo o alternativo (que hoje é denominado “complementar”), como as vans. Este foi um dos motivos pelo qual grande parte da população, sobretudo motoristas cooperativados, deram seu voto de confiança a Paes. Pois bem, cinco anos se passaram desde sua posse junto à prefeitura. O programa foi implantado em fevereiro de 2010 e muito bem recebido, contudo, ainda falta a tão esperada integração com o metrô e com as vans. O resultado é uma grande parcela da população frustrada diante de uma problemática que parece ser tão simples de resolver. Aparentemente, basta que a prefeitura entre em acordo, tanto com o Metrô Rio quanto com as cooperativas, para que o passageiro que utiliza um ônibus municipal possa ser beneficiado ao utilizar um dos dois transportes no espaço de até duas horas, recebendo assim o desconto no valor das passagens.

“Eu pego dois transportes para chegar ao meu trabalho, primeiro um ônibus municipal de Anchieta para a Pavuna e depois pego o metrô até Copacabana”. O trajeto que a jovem Charlene Monteiro, 24, faz de segunda a sexta  leva em média 1h20. Os 20 primeiros minutos, Charlene credita ao primeiro trecho, de sua casa até a estação terminal Pavuna. O restante é o tempo que leva no segundo trecho até a zona sul. Porém, ela reclama não do tempo e sim do mesmo problema que muitos trabalhadores enfrentam. “No começo, minha chefe falava que seria ótimo se o Bilhete Único fosse aceito no metrô após passar o cartão no ônibus que eu pego. Isso representaria uma economia enorme no bolso dela”, diz. a assistente de consultório dentário. Ao passar no primeiro ônibus, lhe são descontados os R$2,75, e ao passar no metrô, são descontados mais R$3,20.

Recentemente, numa pesquisa feita pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), comprovou-se que o Rio de Janeiro é o campeão quando o assunto é o tempo que o trabalhador leva para chegar ao seu local de trabalho. Antes, tal posto era remetido à “Terra da Garoa”, mas a tão agitada São Paulo perdeu a liderança para a “Cidade Maravilhosa” e agora ocupa a segunda colocação num ranking que cidade alguma quer encabeçar. A pesquisa mostrou que, em média, o tempo que nós cariocas levamos para chegar ao nosso trabalho é de quarenta e sete minutos, contra quarenta e cinco de São Paulo. O tempo de deslocamento aumentou 12% nos últimos dez anos no Rio. Uma parcela de culpa pode estar aliada à falta de malha do metrô em relação a São Paulo.

Aliás, por lá, é possível se deslocar por diversos pontos da capital utilizando até quatro transportes ao custo de uma passagem no valor de R$4,65 durante o período de até três horas com o Bilhete Comum, mesmo que seja trem, metrô ou ônibus municipal. Vale ressaltar ainda que, no último dia 21 de novembro, a prefeitura de São Paulo anunciou que o Bilhete Único Mensal Integrado custará R$ 230 por mês. Assim, além de atender e beneficiar o trabalhador, o programa acaba sendo um incentivo ao turismo, cultura e até mesmo ao comércio, já que para quem vai realizar mais de cinquenta viagens por mês a utilização representa uma boa economia.

Por telefone, um representante do Metrô Rio diz caber à Prefeitura tal medida para que seja feita a integração. O que se pode notar é que precisa partir dela (Prefeitura) a atitude para que seja feito um bom acordo para ambas as partes. Como foi mostrado acima, a falta de integração com as vans ainda também é crônica. “Acabei de pagar R$ 2,75 em dinheiro na van que peguei em Campo Grande que me deixa em Coelho Neto, aqui pego o metrô e pago com o bilhete que não me dá desconto algum”, reclama o vendedor ambulante Felipe Gomes, de 32 anos.

Foto: Renan SchuindtEm nota, a Fetranspor (Federação dos Sindicatos das Empresas de Transporte de Passageiros do Estado do RJ), diz que o benefício do Bilhete Único é regulado por legislação específica, cujo teor é ressaltado a seguir: “O Bilhete Único Carioca, pela Lei 5211/10, do Município do Rio de Janeiro, prevê integração ônibus-ônibus de linhas municipais, e ônibus-trem, quando o deslocamento por trem tiver origem e destino dentro do município do Rio de Janeiro.

O Bilhete Único RJ (intermunicipal), pela Lei 5628/09, do Estado do Rio de Janeiro, prevê integração entre um meio de transporte intermunicipal (ônibus, vans, trem e barcas) e outro intramunicipal (ônibus, vans, trem e metrô). Note que na lei estadual (artigo 3º, item IV), o metrô foi classificado pelo legislador como meio intramunicipal. Nas duas legislações não há previsão para o uso combinado de uma linha de ônibus municipal com o metrô”.

A Prefeitura do Rio, por sua vez, diz em nota que vai avançar no assunto tão logo haja “reequilíbrio tarifário”. E ressalta, ainda, que a integração tarifária entre ônibus e trens já está em vigor.

Assim sendo, é possível perceber que o “reequilíbrio” citado, nada mais é que um aumento no valor das passagens para que haja uma compensação que será repassada tanto às cooperativas quanto ao próprio Metrô Rio. Mais uma vez, quem vai assumir esta conta é quem deveria ser o maior beneficiado.

Diante desse panorama característico de falta de regulação do poder moderador do Estado e Município, só nos resta sugerir que o governo reavalie a possibilidade de reestatizar um dos modais, pelo menos, para forçar a regulação do mercado, reassumindo o controle sobre o nível módico da tarifa, conforme reza a Constituição, e restitua o interesse empresarial em adotar o bilhete único com vantagens para o usuário sobre quantidades maiores de passagens (mensal ou bimestral ou semestral), o que existe em todo o resto do mundo, menos no Rio de Janeiro.

Sinal fechado para transportes de massa na Baixada

Fotos: Juliana PortellaA Baixada Fluminense, região que compreende 12 municípios na área metropolitana do Rio de Janeiro (Belford Roxo, Duque de Caxias, Guapimirim, Itaguaí, Japeri, Magé, Mesquita, Nilópolis, Paracambi, Queimados, São João de Meriti e Seropédica) não possui atividade econômica suficiente para empregar e fixar a sua população ativa. Por isso, a maioria dos moradores se desloca diariamente para cidades próximas, principalmente a capital carioca, para, aí, exercer a sua profissão. De acordo com dados do IBGE, Belford Roxo e Nova Iguaçu, estão, respectivamente, em 4º e 14º lugar no ranking de maiores cidades-dormitório do Brasil. Esses dados evidenciam o quanto a Baixada Fluminense depende de uma política eficiente de mobilidade urbana.

Cidades-dormitórios costumam estar ligadas por meios de transporte de massa aos locais de trabalho da maioria de seus residentes. Quando o sistema de transportes não oferece as condições necessárias para atender à demanda satisfatoriamente, o resultado é sofrimento e estresse por parte dos cidadãos. Este, infelizmente, é o caso da Baixada, segundo entrevistados que revelam problemas como a dificuldade de acesso às estações e a inexistência de corredores expressos.

A estudante Ana Kellen Bull, por exemplo, gasta no transporte o mesmo tempo de sua carga horária de trabalho. Ana tem 21 anos, mora em Itaguaí, estuda em Seropédica e faz estágio na Barra da Tijuca. A jovem acorda às 5h para estar na Barra às 8h. “Passo mais tempo no deslocamento do que no estágio e na aula”, conta. No total dos trajetos, ela percorre cerca de 160 km por dia, o que equivale a 6h de viagem de ônibus.

No caminho mais barato, a jovem pega 4 conduções para chegar à Barra e, depois, mais 4 para chegar à Universidade, que fica na BR 465, Km 7, Seropédica. À noite, para retornar, mais duas. O que contabiliza o total de 10 conduções por dia.

“É totalmente desgastante. Chego a ficar desmotivada. Então prefiro pegar o ‘frescão’, pagar a passagem mais cara, mas pelo menos me sinto melhor. Pego uma Kombi até o centro de Itaguaí e lá pego esse ônibus até a Barra. Na volta, eu pego outro frescão até Itaguaí e de lá um ônibus para Seropédica. Pra ir pra casa, pego o ônibus pra Itaguaí, depois uma Kombi para o meu bairro”, relata.

Ela acredita que, se houvesse uma linha de trem ou metrô que atendesse ao seu trajeto, o percurso seria mais rápido. “Mas infelizmente o trem mais próximo é o Campo Grande x Central, e não vale a pena ir para Santa Cruz pegar o BRT”, lamenta.

O governo do Estado do Rio de Janeiro está investindo no projeto do Arco Metropolitano como solução para os problemas viários da região da Baixada Fluminense. A obra, de 145 quilômetros, passará por oito municípios, conectando o Porto de Itaguaí a Itaboraí. Segundo a Secretaria de Obras anuncia em seu site, “o Arco Metropolitano visa estruturar a região metropolitana, através da conexão das cinco grandes rodovias do país – Rio-Santos, Rio-São Paulo, Rio-Belo Horizonte-Brasília, Rio-Bahia e Rio-Vitória – com o Porto de Itaguaí”.

Além disso, o Arco Metropolitano vai permitir a circulação entre os municípios da Baixada Fluminense, a capital e o restante do estado, sem a necessidade de utilizar a Avenida Brasil, que já recebe uma quantidade enorme de veículos por dia. O governo tem divulgado que a obra está em sua etapa final, e que a previsão de conclusão é “2014”. Mas, ainda que possa trazer avanços para a situação “viária”, o projeto não soluciona a carência de transportes de massa para a população.

Aeromóvel em Nova Iguaçu: solução que não saiu do papel

Já em Nova Iguaçu, foi planejado, durante o mandato da prefeita Sheila Gama (PDT), o aeromóvel, veiculo sobre trilhos que, por não possuir motor, é cerca de quatro vezes mais leve que o metrô. Entretanto, o atual prefeito, Nelson Bornier (PMDB), não deu continuidade ao projeto, que já obteve verba do PAC para a sua execução.

“O projeto foi aprovado pelo PAC-II (Programa de Aceleração do Crescimento), que contempla cidades com mais de 700 mil habitantes, e Nova Iguaçu iria receber do governo federal investimentos para viabilizar a instalação do aeromóvel no trecho que liga Cabuçu ao Centro e o Centro a Santa Rita”,informa Fernando Mac Dowell, autor do projeto do aeromóvel, acrescentando que a construção, administração, operação, manutenção e exploração comercial do veículo ficariam a cargo da iniciativa privada.

De acordo com Mac Dowell, doutor em Engenharia de Transporte e ex-diretor do Metrô Rio, o veículo, que já foi adotado pela cidade de Porto Alegre (RS), resolveria os problemas do trânsito e ainda proporcionaria qualidade de vida para a população com as integrações com outros meios de transporte.

Mac Dowell acredita que a solução para o problema de moradores da Baixada como Kellen seria o investimento em transporte de massa, o que não tem sido priorizado pelas autoridades:

“Ônibus não é transporte de massa, graças à sua baixa capacidade de oferta de lugares e também por causa dos seus tempos de embarque e bilhetagem muito grandes”, explica o engenheiro, que defende o aeromóvel como opção para diminuir o tempo de deslocamento e fugir dos engarrafamentos.

A assessoria de imprensa da prefeitura de Nova Iguaçu foi procurada, no dia 14 de novembro, para comentar o status do projeto. Mas, apesar da insistência desta reportagem, até o fechamento da matéria não houve resposta.

Sufoco no busão



Longa espera, ônibus lotado, desrespeito, stress e confusão infelizmente são rotina na jornada diária de um trabalhador que usa transporte público para se locomover pela Zona Oeste.

Neste vídeo, que registra o meu percurso em um dia comum (pego dois ônibus para ir ao trabalho: um Vila Kennedy – Bangu, e o outro Bangu – Cascadura), fica evidente que ainda falta muito para termos um serviço de transporte digno. Circulo muito por aqui e vejo que esse problema é peculiar dessa região.

Tudo parece indicar que o lucro das empresas vem em primeiro lugar, e o conforto do cidadão, em último. O ônibus é pequeno, o que dispensa o trocador e reduz o custo para as empresas, mas aumenta o nível de tensão do motorista e provoca mais desconforto para o usuário. A frota reduzida também aumenta a lucratividade, mas faz o trajeto bem mais demorado e cansativo para quem fica no ponto aguardando o próximo ônibus. Se os ônibus, sozinhos, não dão conta, a Prefeitura deveria dividir a demanda entre outros meios, como as vans, por exemplo. Mas, em vez disso, a Secretaria de Transporte vem impedindo que vans licenciadas operem na região.

Anunciaram o novo ordenamento das empresas, agrupadas em consórcio, mas como os donos das empresas são os mesmos, é natural que se questione se o consórcio é realidade ou ficção. Além disso, permanecem as suspeitas de que há oligopólio familiar nas áreas de Cascadura e Bangu.   

Como diz a pesquisadora Mirena Silva em sua dissertação de mestrado apresentada à COPPE/UFRJ em 2011:

"Com as privatizações do funcionamento das redes ferroviárias e do Metrô, entregues pelo Estado do Rio de Janeiro para a iniciativa privada na década de 90, fato esse aliado ao oligopólio das empresas de ônibus coletivos, permitiu-se que as políticas públicas de transportes fossem, em sua maioria, direcionadas de acordo com a rentabilidade do mercado. Isso contribuiu para aprofundar a dualidade urbana, a marginalidade e a exclusão socioterritorial, aumentadas pelas diferenças de oferta, qualidade e preço das formas disponíveis de transporte coletivo".

Quem tiver interesse em se aprofundar no assunto, o trabalho completo está disponível neste link.

Ausência do poder público prejudica transporte em Paquetá

Fotos: Mariana AlvimUma ilha já é, por natureza, isolada. No entanto, os moradores da Ilha de Paquetá parecem ter ficado, nos últimos anos, ainda mais separados da cidade do Rio de Janeiro devido à ausência de alguns serviços públicos, como o transporte. Na opinião de boa parte dos moradores, o serviço da CCR Barcas, único a transportá-los ao centro do Rio, melhorou, mas ainda precisa mudar. No que diz respeito ao transporte dentro da ilha, falta uma presença mais efetiva do poder público e a regulação de tradicionais formas de locomoção.

Na área com aproximadamente 1,2km², os cerca de 4.500 moradores se locomovem a pé, de bicicleta, com eletrotáxis (uma espécie de triciclo elétrico) e com o “trenzinho” (algo como um bondinho rebocado por um trator). As charretes estão diariamente circulando pela ilha, mas são usadas, sobretudo, por turistas.

A começar pela pavimentação, ela é problemática com chuva ou sol. “Calçada aqui não existe. Quando chove, há muita lama, e quando há sol, muita poeira”, contou o morador Marcos Madeira, que carregava sua filha em um carrinho. A prefeitura, ao que parece, não tem planos para solucionar a questão, já que a Secretaria de Conservação afirma que “grande parte das calçadas são de responsabilidade dos proprietários das casas”.  

As calçadas na ilha são poucas, estreitas e mal-conservadas. De acordo com Sylvio de Oliveira, presidente da Associação de Moradores da Praia Morena, os deficientes físicos dependem dos ecotáxis, que não têm gratuidade e cobram R$4, independentemente do percurso. O veículo tem um custo inferior ao dos combustíveis tradicionais (como álcool e gasolina), mas por não haver qualquer regulamentação por parte do poder público, fica difícil avaliar se o valor cobrado é justo ou abusivo. Segundo o ecotaxista Ednard Lima Pereira, o gasto diário com bateria é de cerca de R$8-10.

A vereadora Laura Carneiro propôs um projeto de lei que regulamenta os eletrotáxis, mas este ainda não foi à votação. O prefeito Eduardo Paes, ao visitar a ilha, em julho, afirmou que iria legalizar esta forma de transporte, mas, segundo a Secretaria Municipal de Transportes, este projeto ainda está em estudo. Enquanto isso, moradores apontaram problemas como menores dirigindo, excesso de velocidade e má-conservação dos carros. Segundo um funcionário da Câmara Municipal, que preferiu não se identificar, o controle do preço dos transportes cabe ao Executivo logo, não estaria na alçada do projeto de Laura Carneiro.

Há também a opção do “trenzinho”, que acompanha os horários das barcas, mas, de acordo com o morador Marcos Madeira, este frequentemente não funciona, pela má-conservação.

As charretes, movidas por cavalos, não são utilizadas pelos moradores no dia-a-dia, mas ganham deles atenção significativa por sua polêmica. Em julho, a Secretaria de Promoção e Defesa dos Animais chegou a proibir a circulação deste meio de transporte na ilha por denúncias de maus tratos aos cavalos. Hoje, no entanto, ele permanece liberado. De acordo com a psicóloga Silvia Gonçalves, ativista pelos direitos dos animais na ilha, a cocheira onde ficam os cavalos está interditada desde 2010 por estar parcialmente destruída. Segundo ela, os animais ficam em contato direto com esgoto e passam por maus tratos como excesso de peso e chicoteamento.

Alex Araújo, 40, e Luís Fernando, 59, fazem coro àqueles que apontam as charretes como uma tradição da ilha. “É só você olhar para os cavalos e ver que eles são bem tratados. Uma ou duas pessoas não tinham cuidado com os animais, mas hoje elas não trabalham mais”, contaram os condutores das charretes. Para Silvia, no entanto, mesmo que haja fiscalização, a atividade em si já tira a liberdade dos cavalos. “A tradição não pode prevalecer sobre a vida dos animais”, afirmou a ativista. Trazendo a polêmica para o plano global, cabe lembrar que boa parte das cidades turísticas do mundo mantém ainda hoje este tipo de passeio a cavalo, como Nova York e Londres, por exemplo.

O frentista William Silva de Sousa, 49, que não gosta do mau cheiro deixado pelas charretes, afirma que já foi pior sair da ilha. Para ele, depois que a CCR Barcas aumentou o número de saídas e trocaram as embarcações, ainda neste ano, não há nada a reclamar. Ele, no entanto, trabalha à noite e, por isso, pega o fluxo contrário do resto dos moradores. Situação bem diferente de Marileide Gomes, que diz que as barcas não comportam a demanda do horário de maior procura. Ela contou que já foi parar no hospital com aumento de pressão por não conseguir embarcar e que já recebeu notificação do trabalho por chegar atrasada. “A grade de horários é suficiente, mas a capacidade e a qualidade, não”, afirma a telefonista, referindo-se à má-conservação das embarcações.

De acordo com a CCR Barcas, hoje acontecem 16 viagens por dia na linha, o que corresponde a 72% a mais do praticado anteriormente. O tempo de viagem também foi reduzido, passando de 70 para 40 minutos. Os intervalos entre cada saída da ilha variam de 1h a 1h30. Assim, o professor Leonardo Couto, que ficou de fora da embarcação que saía às 8h de uma quarta-feira, teve que esperar até 9h30 pela próxima saída. Ele conta que foi a terceira vez que isso aconteceu, em apenas duas semanas. “Com certeza eles deveriam ter um lugar pra mim, afinal eles prestam um serviço”. Os moradores afirmam que o verão, as segundas-feiras (quando os veranistas vão embora) e o início do mês (quando os moradores vão fazer compras fora da ilha) são os períodos mais críticos.

Em sua visita à ilha, o prefeito Eduardo Paes prometeu dar maior atenção à localidade. “Essa cidade é enorme e eu reconheço que Paquetá acaba saindo prejudicada, é uma ilha, o deslocamento não é täo fácil, e a gente acaba ouvindo mais o grito de outras áreas do Rio. Vou criar uma frequência de visitas e pelo menos a cada seis meses vir aqui”, afirmou a sua assessoria.

De acordo com Sylvio de Oliveira, a prefeitura tem sido receptiva quanto às demandas da associação. No entanto, projetos como a presença de guardas municipais e a regularização da velocidade das bicicletas elétricas enfrentam a lentidão e a burocracia características do poder público brasileiro.

#17 Mobilidade urbana

Com esta edição da Revista Viva Favela, ampliamos a disseminação de conceitos básicos sobre mobilidade urbana, dando mais consistência ao chamado “tecido” social que, pela diversidade e igualdade, fortalece os conceitos de nação desenvolvida.

Mobilidade urbana é se locomover com facilidade pela cidade, independente do tipo de veículo utilizado. Ter mobilidade é ter a garantia de que se chegará a um lugar, de forma rápida, com conforto e segurança. É ter alternativas: para deixar o carro na garagem, para escolher um modal que me convenha, para pagar o valor de tarifa que possa, naquela hora. É dispor de ciclovias, se tiver condições de optar por atividades físicas e de sustentabilidade sócio-ambiental. É também ter calçadas que garantam acessibilidade aos deficientes físicos e visuais, e segurança aos idosos ou qualquer outro com mobilidade reduzida, porque essa igualdade de direitos consolida a sensação de plena cidadania.

Cabe aos governos estabelecer políticas públicas de transporte, trânsito e de uso e ocupação do solo, de forma a atender o conjunto da população. Um plano diretor, elaborado com a participação da sociedade, é a ferramenta que irá diminuir o número de deslocamentos, proporcionando acesso amplo e democrático ao espaço urbano, sem restrições de qualquer natureza, sem gerar segregacionismo, e perseguindo a melhor qualidade de vida.

Com isso, o desestimulo ao uso de veículos particulares será natural e acontecerá em função da eficiência, regularidade, conforto e segurança do transporte público coletivo e de massa, culminando com uma política de passe livre, assim como ocorre com a saúde e a educação. Quando chegarmos lá, estaremos concorrendo com o Butão, melhor “ranqueado” do que o Brasil em escalas classificatórias internacionais sobre felicidade.



 
Panoramas territoriais
Da Baixada Fluminense à ilha de Paquetá, via Rocinha: a quantas anda a mobilidade urbana?

Sinal fechado para transportes de massa na Baixada
Juliana Portella | Nova Iguaçu | RJ

Ausência do poder público prejudica transporte em Paquetá
Mariana Alvim | RJ

Transporte alternativo na Rocinha
William de Oliveira | Rocinha
 
Diários de mobilidade
Dois usuários sacam suas câmeras: uma de fotografia, outra, de vídeo, para registrar e refletir sobre os transportes que utilizam.

Sufoco no busão
Guilherme Junior | Vila Kennedy | RJ

Instantâneos da mobilidade
Roberta Machado
 
RJ: Políticas públicas na berlinda
Correspondentes "embarcam" em três temas polêmicos: teleféricos em favelas, CPI dos ônibus e a versão carioca do bilhete único.

O Bilhete Único Carioca e a falta de unificação
Renan Schuindt | Costa Barros | RJ

A caixa preta do transporte público carioca
Rosilene Miliotti | Maré | RJ

Teleférico ainda é alvo de polêmica
Thathiana Gurgel | RJ
 
Mobilidade radical
Entre o transporte e o esporte, um jeito diferente de circular pelo espaço urbano

Parkour: locomova-se com arte
Debora Pio | RJ

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