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Cidade de Deus protesta e pede fim da violência

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Vestidos de branco, os moradores pediram o fim da violência na Cidade de Deus (Fotos: Marcelle Gebara)

A Cidade de Deus foi a segunda comunidade do Rio de Janeiro a receber o projeto de pacificação. A UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) chegou em 2009 e hoje conta com o efetivo de 343 policiais que atendem os seus mais de 2 km de extensão onde habitam cerca de 47 mil moradores espalhados por 18 territórios. Assim como em outras partes da cidade, o projeto é problemático. Às vésperas do Natal, onde as pessoas estão circulando mais pelas ruas e as crianças estão de férias, segundo relato de moradores, um grupo de milicianos chegou à favela e abriu fogo. Quatro pessoas foram atingidas, um adolescente e uma criança morreram. O crime interrompeu o ritmo festivo que pairava sobre a Cidade de Deus na ocasião.

Wagner Novais, cineasta, morador da comunidade, acha que o projeto de pacificação não é um projeto de paz. “Eu quero ver escola, saúde, transporte e educação, porque polícia já tem demais. Ta faltando é dignidade. Faz uns anos que o Governo do Estado está construindo uma escola de nível médio. Investimento de 6 milhões e ela não está pronta”, reivindica Wagner, que acredita que segurança pública pode ser garantida por meios que não sejam o da repressão.

Ninguém aguenta mais

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Os cartazes pediam paz para a comunidade e justiça para as vítimas

O episódio que vitimou Marcos Vinicius dos Santos, de 11 anos e Breno da Silva Gomes, de 14 e ainda deixou Joaquim Cândido e uma mulher que não quis ser identificada feridos, funcionou como um estopim para que os moradores fossem para as ruas clamar por dias de tranquilidade. Em um misto de revolta e indignação, no penúltimo dia de 2015, vestidos de branco, manifestantes se reuniram de forma pacífica na esquina da Rua Josafá com Edgar Werneck.  Segundo relatos, os principais suspeitos do crime são milicianos que atuam na Gardênia Azul. A Divisão de Homicídios da Capital (DH-Capital), investiga o caso e um suspeito já foi preso.

Rogério de Souza, que estava na rua na hora do crime,  contou que vários homens entraram na favela atirando. Segundo ele, havia muitas pessoas na rua no momento em que os assassinos chegaram.  “Eles vieram para matar. Eu estava jogando fliper e vi tudo. A rua estava tranquila e, de repente, apareceram homens atirando do nada”, conta. “Moro aqui desde que nasci e nunca tinha presenciado nada igual. É inacreditável o que aconteceu, foi covardia. Os muros da rua estão cheios de tiro”, revoltou-se  Rogério, indignado, enquanto apontava para as marcas da insegurança.

Já Lúcia de Freitas, que também mora na CDD, não acredita que tenha havido tiroteio como foi divulgado.  “Não foi tiroteio porque só haviam jovens e crianças na rua brincando. A gente se sente preso dentro da própria casa. É uma sensação de insegurança enorme”, define.

Um dos pontos altos da manifestação foi a intervenção artística da atriz e moradora da comunidade Giovana Rocha. Os organizadores do evento, desde o primeiro momento, tinham pensado em utilizar brinquedos como forma de protesto. Eles foram colocados no chão para simbolizar a interrupção da infância das crianças e este espaço também serviu como palco para Giovana recitar a poesia “Da Paz”, de Marcelino Freire.

 

Protesto reuniu artistas

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Os brinquedos no chão representavam a infância perdida das crianças vítimas da violência

Famoso por ser um dos compositores do clássico “RAP da Felicidade”, MC Doca, que até hoje mora na comunidade, fez questão de participar do protesto e também clamou por dias melhores. “A CDD já não aguenta mais, quem morreu foi um de nós, queremos paz”. O cantor Tonzão Chagas também gritou por justiça. “2015 foi o ano que mais tiveram homicídios na Cidade de Deus – para a maioria deles não temos resposta. Não nos conformamos com essas estatísticas. Ninguém vai nos calar. Já chega de ver amigo morrer aqui na Cidade de Deus”, disse, categórico.

Pai de uma das vítimas, Marcos dos Santos, também compareceu ao protesto, agradeceu pelo carinho dos vizinhos e amigos e pediu justiça para seu filho. “Meu neném me ajudava todos os dias, estou sem chão, mas vou lutar por justiça e para que isso não aconteça com nenhuma outra família”, lamentou.

Os mesmos alvos de sempre

Para a jornalista Cecília Olliveira, que é especialista em criminalidade e segurança pública, está estabelecida uma relação de perseguição a uma classe que é, em sua maioria, composta por  pobres, negros e moradores de áreas populares. “Não existe guerra contra coisas, mas sim, contra pessoas. E qual o perfil do ‘inimigo’ nesta guerra? Majoritariamente negros, pobres, moradores de áreas populares. Nestas áreas, tudo é permitido, afinal, há de se salvar a sociedade do ‘mal’ que ali impera.”

Para a especialista,  que é uma das autoras de ‘Abordagem Policial’,  um blog de polícia e segurança pública, solucionar o problema da violência só será possível a partir da  revisão da política de legalidade das drogas.  “Os índices de violência estão diretamente ligados ao tipo de política que temos. Na verdade, nossa polícia cumpre muito bem o papel que lhe é designado.  Se a política de drogas não for revista, a ‘guerra’ não vai acabar. Os problemas serão diminuídos, mas o estado de ‘guerra’ não será revogado.

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