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Pacificação cria “deserdados” do tráfico

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Foto: DivulgaçãoDesde a primeira Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) – instalada na favela Santa Marta, em novembro de 2008 – o mercado de trabalho oferecido pelo tráfico de drogas entrou em declínio. O tráfico armado praticamente desapareceu das favelas retomadas pelo poder público, embora a venda de drogas ilegais ainda aconteça.

Estudo publicado pela Folha de S. Paulo, em novembro de 2010, estimava, então, em 16 mil o número de “empregados”do tráfico no Rio de Janeiro. Não há levantamento recente, mas a redução da mão-de-obra dedicada a essa atividade é visível, o que significa que é grande o número de “deserdados” do tráfico. “A pacificação foi a chance para muitos mudarem de vida. Hoje o risco de você ser preso vendendo drogas é muito maior”, relata um ex-traficante, que, constrangido por esse passado, prefere não se identificar. Como ele, ex-traficantes estão em busca de emprego, mas esbarram nas mesmas dificuldades que os demais desempregados da cidade, especialmente os das favelas e periferias.

Para Adair Rocha, autor do livro “Cidade cerzida: a costura da cidadania no morro Santa Marta”, as dificuldades dos ex-traficantes para entrarem no mercado de trabalho são idênticas às de quem vive à margem da sociedade. “É igual para todos. A falta de experiência profissional e a precária formação escolar são iguais para os traficantes e para os milhares que vivem no mesmo espaço de exclusão.”, assegura o estudioso de favelas há 32 anos e professor da PUC e da Uerj. “O mercado tem que empregar quem está desempregado”, teoriza ele, que considera esse um desafio para o poder público e para a sociedade.

Foto: William de Oliveira“Não conseguimos emprego fora da favela”, revela outro ex-traficante. Eventuais antecedentes criminais são os principais obstáculos no mercado de trabalho do asfalto. “Se a gente vai para uma entrevista de emprego e eles observam que nós temos passagem pela polícia, já não ligam mais. Aqui na favela é diferente, as pessoas nos dão mais oportunidades”, diz ele, que hoje é motoboy. Apesar da facilidade maior na favela, muitos ex-empregados do tráfico têm que suar a camisa para reconquistar a confiança das pessoas do morro: “para alguns é mais difícil porque as pessoas não esquecem o passado… Se o cara esculachou uma família essa família nunca vai dar oportunidade para ele”, conta.

Fora da favela, o emprego informal é o caminho mais comum para quem deixa o tráfico. Muitos ex-traficantes trabalham hoje como motoboys, pedreiros, porteiros, vigias de estacionamento ou são pequenos comerciantes. Como a grande maioria não completou os estudos, o emprego autônomo e informal é visto como mais vantajoso: “vale mais a pena pelo financeiro e por termos mais tempo livre”. No mototáxi, por exemplo, cada um faz sua meta por dia e define o horário de trabalho. Todos os entrevistados contaram que sonham em voltar a estudar, aprender uma língua e fazer cursos.

Para um desses ex-traficantes, que entrou para o tráfico aos 17 anos e hoje tem 40, a grande diferença entre o trabalho no tráfico e o trabalho fora do crime é o rendimento. Vendendo drogas ele recebia R$ 3 mil reais por mês. Hoje, como motoboy, ele ganha cerca de R$ 1.500. “Esse é o fator principal que leva os jovens para o tráfico. Ao ver o amigo da escola bem vestido e cheio de grana para fazer um serviço “tranquilo”, ele vai querer fazer isso também”, conta. Para ele, no entanto, nada compensa a perda da liberdade de ir e vir e, fundamentalmente, da vida. “Muitos já morreram, o que adiantou a grana toda?”.

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