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Tuberculose na Rocinha sobrevive ao PAC

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A rua 4 foi alargada e ganhou área de ventilação. (Fotos: William de Oliveira)

A rua 4 foi alargada e ganhou área de ventilação. (Fotos: William de Oliveira)

As obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na Rocinha surtiram um efeito colateral não esperado pelos moradores da rua 4: a redução dos índices de tuberculose. O local era conhecido na favela como o de maior número de doentes e hoje, depois da obra que transformou o beco numa rua – ainda estreita, mas com  quatro metros de largura – mais clara e arejada, este número está em queda. Quem afirma isso é o agente comunitário de Saúde Marcondes Ximenes, 36 anos, morador da Rocinha e ex-paciente de tuberculose.

Ximenes lembra que a Rocinha é uma das comunidades com a maior incidência de tuberculose no Rio, cidade que reúne a maior concentração de casos no Estado: são 300 doentes para cada 100 mil habitantes. Este número é superior à média registrada no Brasil, em torno de 37,4 doentes para cada 100 mil habitantes, segundo dados de 2010 do Ministério da Saúde, que alerta para o fato de a doença ser um grave problema de saúde pública em todo o mundo.

Com a redução dos índices na rua 4, Ximenes aponta os sub-bairros Macega e Roupa Suja, próximos à rua 1, como as áreas com condições mais propícias à transmissão da doença na comunidade. Essas localidades têm alta densidade demográfica, com uma casa em cima da outra, becos estreitos e escassa  ventilação, fatores que oferecem ambiente à proliferação do bacilo de Koch, a bactéria que causa a doença.

A transmissão da tuberculose é direta, de pessoa a pessoa. O doente expele, ao falar, espirrar ou tossir, pequenas gotas de saliva que contêm o agente infeccioso e podem ser aspiradas por outro indivíduo contaminando-o. Somente 5% a 10% dos infectados pelo bacilo adquirem a doença. Ano passado, no Brasil, segundo o Ministério da Saúde, foram registrados 70.047 novos casos.

Brasil tem grande número de casos

Agentes de saúde acompanham doentes em casa

Agentes de saúde acompanham doentes em casa

A taxa de incidência da doença no mesmo período foi de 36,1 para cada 100 mil habitantes, fazendo com que o Brasil ocupe atualmente o 17º lugar num ranking de 22 nações com grande circulação da doença. A tuberculose representa hoje, no país, a quarta causa de morte por doenças infecciosas e a primeira causa de morte por doença identificada entre pessoas com HIV. Em 2010, a tuberculose vitimou 4,6 mil brasileiros e a taxa de mortalidade registrada foi de 2,4 para cada 100 mil habitantes.

Estes números ganham cara na Rocinha. Alicia Maria de Souza, de 79 anos, moradora há 67 anos da rua 4, sabe bem disso. Ela cuidou de dois filhos que contraíram recentemente a doença e contou com a ajuda dos agentes de saúde. “Eles traziam os remédios na hora certa, o que facilitou muito o tratamento”, conta Alicia, que diz que a abertura da rua melhorou a qualidade de vida de todos no local ao arejar o ambiente e facilitar o acesso às casas.

Na mesma rua 4, onde mora há 15 anos, o ajudante de produção Allan Moreira de Lima, 33 anos, teve a forma mais perigosa da doença. “Eu não tinha os sintomas clássicos, como escarro e tosse. Apenas sentia muito cansaço e falta de ar. Só descobri que estava doente porque a minha namorada ficou tuberculosa e eu tive que fazer os exames”, conta Allan, que se tratou durante um ano. Ele atribui à falta de sol e ventilação na antiga rua 4 as causas da doença. “Aqui era um ambiente fechado e úmido e tinha muita gente doente. Acho que se a obra tivesse sido antes, eu não teria ficado doente”, conclui.

A redução dos índices de tuberculose na área da rua 4, porém, não surpreendeu o governo do Estado. Em 2007, o presidente da Empresa de Obras Públicas do Estado do Rio de Janeiro, Ícaro Moreno, já dizia que “a questão da tuberculose foi levada em consideração na época da criação do plano urbanístico e social da Rocinha. Esse foi um dos motivos para a escolha da área exemplar, que possui 56 mil metros quadrados e abriga cerca de 16 mil pessoas. Ou seja, é densidade equivalente a 0,28 por metro quadrado. Nossa meta é reduzir esse adensamento populacional e melhorar a qualidade de vida dessas pessoas”.

Governo promete mais obras

Moradores pedem obras para acabar com valões

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Em reunião, dia 9 de junho, com os moradores para discutir as obras do PAC 2, Ícaro voltou ao assunto, e prometeu que a rua do Valão – onde também haverá uma estação do teleférico – receberá obras como as da rua 4.

Quem ainda não foi beneficiado pelas obras do PAC reclama. Para a doméstica Elizângela Vítor de Oliveira, 39 anos, que mora na parte baixa da rua 4, onde as obras não chegaram, o PAC não fez diferença. Em tratamento há cinco meses, Elizângela já viu o pai e o irmão contraírem tuberculose, mas tem pouco conhecimento sobre a doença: “Nem sei como fiquei doente. Não sei nem se isso é hereditário.”

O cozinheiro Raimundo Barbosa da Silva, 65 anos, que se descobriu tuberculoso há três meses, mora na rua 4 perto do valão, onde ainda há esgoto a céu aberto, que arrasta o lixo. Ele cobra as obras prometidas e diz que se não saírem até o fim do ano vai procurar lugar melhor para morar. “Moro aqui há 23 anos, sentindo cheiro de vala. A Rocinha precisa de saneamento básico”, sentencia.

Vizinha de Raimundo, Carmelita Santos, 48 anos, mora de frente para o valão e tem longa história de tuberculose na família. A doença matou sua irmã Teresa, deixou o irmão doente e atingiu seu filho Francisco Antônio, 22 anos, duas vezes. “Quando a médica me disse que eu estava com tuberculose, foi um baque para mim. Fiquei arrasado”, diz Francisco, indignado. Quem cuida dele é Carmelita, que  sonha ver a comunidade livre dos valões. “O teleférico vai ser muito bom, mas acabar com as valas seria melhor ainda”, diz Carmelita.

O agente comunitário de Saúde Éden Jose dos Santos, de 43 anos, que trabalha diariamente para o diagnóstico e tratamento da doença, concorda que o saneamento básico deva ser prioridade, já que a comunidade tem muitas valas. “Se as obras realizadas da rua 4 tivessem sido feitas em toda a Rocinha, teríamos uma baixa enorme no índice de tuberculose”, acredita.

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