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O apetite do trabalhador paulistano

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Nas casinhas ainda inacabadas, em intermináveis reformas, tocam os despertadores. Às 4h da manhã, na região periférica de São Paulo, pais e mães de família pulam da cama para garantir o sustento, o pão de cada dia.

O galo que canta é a necessidade de sair, sempre correndo, indo contra o tempo, sem parar para ver o sol nascer. O café da manhã difere bastante daquele servido nos hotéis em que os turistas são recebidos em nosso país.

Em muitos pontos de ônibus, barracas montadas vendendo café com leite, coxinhas fresquinhas, salgados de modo geral, chocolate quente, bolo de muitos sabores etc. Este trabalho é resultado do suor de famílias que dão um duro danado para dar "sustento" aos que também cedo madrugam e não têm tempo para alimentar-se direito. Claro, não poderia deixar de lado, de modo algum, sempre esses espaços estão lotados, gente pagando pouco e comendo bem, tudo quentinho, feito com muito cuidado e carinho.

Em muitos lugares não falta o que colocar na mesa, mas, o tempo é inimigo. Não raro é engolir o que é preparado rapidamente – e não mastigar direito – antes de encarar o busão, ou simplesmente o trânsito, escutando um som num confortável carro popular. Já que o crédito para tirar um seminovo, ou um ainda recém-saído da fábrica, está facilitado, dá pra pagar em até cinco anos, com a possibilidade de refinanciar, caso se enforque no caminho.

Para o almoço, a famosa marmita ou o "prato feito". Quando não é assim, sobra a alternativa de comer no Bom Prato – programa de alimentação popular implementado pelo Governo do Estado de São Paulo – por apenas R$ 1. Já ia me esquecendo de que nesse mesmo lugar eles servem café da manhã pela metade do preço citado agora pouco. A fila, em qualquer um dos dois horários, é de perder de vista.

Isso para quem sai para trabalhar longe, durante a semana. Pra quem fica por perto, quase sempre por ter comércio próprio, pode almoçar em casa, nos botecos do bairro que servem aquele almoço reforçado ou uns salgadinhos requentados. Quando a correria é grande tem a opção de comer o que chamam de churrasquinho de gato ou o grego – o segundo vem com um suco de brinde. É até engraçado, mas amplo é o cardápio gastronômico em cada região periférica de São Paulo.

Rango também é cultura. Casas do norte, festas juninas, as confraternizações em que as pessoas – quando não compram na padaria ou no mercado – levam pratos que são receitas herdadas de familiares antigos, que não morrem e atravessam gerações e gerações. Sem contar as festas que acontecem nas casas, sempre as pessoas vão não apenas com foco na diversão. Quem está presente sabe que algum tipo de comida não vai faltar.

A refeição clássica do domingo é o frango assado. Em todas as padarias são vendidos. Tem gente que reserva para retirar bem próximo do horário do almoço que, neste dia, é um pouco mais tarde que o habitual. Afinal, o alarme não precisa soar antes do sol nascer.

Com consciência plena de que comida ainda falta em muitas dispensas, sabendo também que não falta solidariedade nas famílias periféricas, vejo, aos montes, gente levando alimentos não perecíveis para as igrejas para que sejam doados pra gente que não tem. Aos poucos, com muito pouco, uma gotinha em meio ao oceano de dificuldades brota em cada coração. Percebo surgir uma fonte inesgotável de bondade e amor em ajudar o semelhante.

O complemento desse relato é a trilogia periférica do Urbanista Concreto, Germano Gonçalves. Amanhecer na Periferia, Tardes Periféricas e Anoitecer na Periferia.

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