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Construção coletiva é o mote do Tangolomango

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O Festival Tangolomango reuniu representantes de várias artes durante o final de semana (Fotos: Rosilene Miliotti)

A diversidade cultural chegou com tudo no Circo Voador. Isso porque o Tangolomango – Festival Internacional da diversidade cultural – reuniu no último domingo, dia 8, malabares, funk, teatro, dança, corda bamba, kuduro, maracatu e, muito outros estilos em sua 20º edição. Com o tema “Rio- Conexão Internacional”, o Festival visa promover o intercâmbio cultural entre artistas brasileiros e estrangeiros. Baseado na troca, produção compartilhada e a generosidade intelectual, o Tangolomango juntou dez grupos diferentes para uma apresentação inédita criada de forma inteiramente colaborativa. A apresentação no Circo Voador foi o resultado de um processo que durou três dias e teve como palco a Fundição Progresso e as ruas da Lapa.

A dinâmica foi dividida em três momentos. No primeiro, os grupos selecionados se reuniram para conhecer um ao outro e apresentar seus trabalhos. Nesta etapa, exercícios de reconhecimento dão o tom. “Eu olho no seu olho e abraço as pessoas. Elas vão se tocando, se conhecendo. Aí você mostra o que você faz pra mim, eu mostro o que eu faço pra você. Todo mundo mostra um pouquinho do que faz”, explica Marina Vieira, idealizadora e coordenadora do projeto. Em seguida, cada equipe sugere uma atividade, seja uma dança, uma música ou outra atividade, e todos acompanham. Assim é feito com cada grupo, “aí depois já virou uma coisa só“, conclui ela.

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Tambores e dança reunidos debaixo dos arcos: troca intensa

La Original Orquestra de Música Latina, Negro Mendes, Orquestra Tuhu e Tambores de Olokun são os grupos musicais que compõem o Festival. Todo som do espetáculo é produzido em conjunto por eles. Diferentes dos festivais convencionais, eles não tocam em momentos diferentes, mas sim juntos. “Tem que saber ouvir, saber acompanhar, saber dar aquilo que o outro vai precisar. É um aprendizado pra vida. Então qualquer grupo que venha pra cá, acaba saindo muito diferente. Eles saem melhores porque fica permeável com as coisas que vão entrar sabendo se doar para os outros”, explica a  idealizadora.

Para o Juan Phelipe, 28, integrante da orquestra La Original, o primeiro dia foi o mais difícil. “Superação” é a palavra que ele usa para definir o Festival. Lidar com outras pessoas e culturas nem sempre é fácil. “É um exercício de superação! Superar as diferenças, as culturas são totalmente diferentes, principalmente no trato. Pra mim, particularmente, foi um exercício de superação. Principalmente ontem, que foi o primeiro dia, eu senti uma carga emocional muito forte em cima de mim. Teve um momento que eu me afastei, fui me recompor e depois voltei. Hoje eu já vim incorporado no espírito de tangolomango, aí foi e está sendo bem intenso”.

No dia seguinte acontece o segundo momento, que é o de criação coletiva do espetáculo, envolvendo troca de ideias e experiências. Cada equipe surge com uma ideia e formam um aglomerado delas.  No entanto, o tempo para definir o que será válido é curto. Até chegar a um denominador comum, muitas perguntas são feitas. “Esse primeiro momento é o mais difícil, de se conhecer, entender o que o outro quer, tentar fazer uma relação com outras áreas como, por exemplo, a do circo. O que aquelas pessoas do circo já tem feito? Qual performance que eles já tem construída? Vamos partir daí? Não! Vamos partir da música? Vamos partir dos dançarinos? Que tipo de música a gente pode levar? Vai levar uma salsa que é o gênero que a banda toca? Não, vamos trazer uma outra ideia inicial, depois a gente volta pra salsa. Então, a gente caminhou por essa direção, assim. Funcionou!”, diz Emerson Costa, 35, saxofonista. “O legal disso é que a gente tá aprendendo muita coisa e fazendo, que é o melhor de tudo. Eu acho que a prática é o que move a gente. Conseguimos interagir melhor e entender melhor o que eles querem”, conclui ele.

Produção lationamericana

A La Original é metade argentina e metade brasileira. Isso porque Agustin Rios, diretor musical da banda, é argentino. Reinaldo Godoy, que toca trompete, explica que foi possível acompanhar o estilo musical estrangeiro por conta de sua experiência na música, e compara esta vivência com o Festival. “Mas o princípio é isso mesmo, a mesma dificuldade que teve pra montar com a galera do circo foi a nossa dificuldade no início com a banda.”

A visão musical do ator sobre a cena é diferente da visão do músico, que tem uma visão ‘partiturada’. Como todo som do evento é feito pelas bandas, surgem alguns conflitos antes de encontrar a harmonia que dará continuidade ao ensaio. “O lado mais difícil foi o lado dos músicos com os artistas que executam com seus corpos. Tem que ter uma deixa, tem que ter um andamento, uma marcação. Eu acompanhei realmente lugares tensos, tiveram discussões fervorosas de lideranças de grupo que chegou um ápice, assim, de uma discussão, isso faz parte e o resultado ficou excelente!”, explica Bruno Oliveira, ator da Cia. Les Trois Cles.

Múltiplas linguagens trabalham coletivamente

Representando o teatro está a Cia. Les Trois Cles e do circo estão os coletivos “Deslocadas” e “Veracidade”. Diogo Monteiro, do Veracidade, já participou de outros festivais e vê no Tangolomango um espaço de troca “onde pessoas de diferentes vivências, grupos que talvez nunca se cruzassem vivem uma troca espontânea que é muito bonito e muito rico. Isso é natural dos festivais, mas, sobretudo, aqui no Tangolomango isso acontece com uma força e é muito genuíno como isso acontece aqui, é muito construtivo”, conta ele.

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Ernesto Piccolo (no centro) é quem ajuda a conduzir os processos

Um dos elementos fundamentais para que a trupe funcione é a forma que Ernesto Piccolo, diretor artístico, conduz o aprendizado. Para Diogo, Ernesto não tenta impor o que pensa, nem a forma como as coisas devem ser, o que fez com que ele aproveitasse bastante o evento. “Por sorte, pelo menos pra mim, eu tive encontros muito generosos. A gente foi muito mais baseado pelo sim, do que pelo não. Então alguém vinha com uma ideia e a gente falava: sim. E vinha outra pessoa com outra ideia e falava: sim! E esse monte de sim junto foi se transformando e virando uma coisa de todo mundo.”

O aprendizado, no entanto, vem na construção das apresentações coletivas.  A companhia francesa Les Trois Clés – que teve sua equipe brasileira montada pela diretora Eros Galvão – trabalha com manipulação de bonecos. O momento de contracenar ricom outras pessoas é caracterizado por Bruno como um momento de descoberta. “A gente vem com bonecos e tem que descobrir a dança das pessoas e a dança das pessoas com os bonecos. Não é só manipular e ficar na sua partitura, tem que descobrir como eu vou agir com corpos, com outros corpos, corpos humanos. Porque a gente faz peça boneco com boneco e a gente teve que descobrir contracenar com humanos”, conta ele.

A dança foi marcada pela A Cia Corpus Entre Mundos que mistura dança contemporânea, Kuduro, Hip Hop, Afro e ballet com bailarinos de diferentes nacionalidades. O passinho da Cia de Dança NA BATALHA que transformaram o estilo de dança em uma expressão social e cultural de juventude de periferia, para fazer o público cair no funk. E a Asmahan que é o toque oriental do Tangolomango. “É um estúdio e laboratório de criação que trabalha com a dança do ventre e fusão (tribal), com uma proposta que busca a difusão e atualização das danças das antigas sociedades matriarcais”, explica.

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Ao final dos três dias, um espetáculo é montado reunindo todas os artistas que participaram da imersão

O terceiro e mais esperado momento é a apresentação do grande grupo que se forma durante a vivência. Da experiência proporcionada pelo festival fica o aprendizado. Alguns grupos estendem o encontro provocado pelo Festival para a vida. Marina acredita que principalmente os grupos que residem no Rio de Janeiro acabam mantendo o contato. “Mesmo assim, quando a gente estava lá fora teve grupo da Argentina que foi pro Ceará. E isso aí não dá nem pra acompanhar, a gente vai deixando pelo caminho pequenos núcleos”, conta ela. Seu sonho, no entanto, seria ampliar o projeto para que diferentes locais tivessem seu intercâmbio cultural. “Na verdade meu sonho é transformar o Tangolomango em política pública. Se tivesse isso em mais lugares seria lindo porque as pessoas iam desenvolver isso localmente”, diz ela.

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