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Uma década de indignação na Baixada

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A chacina fez 29 vítimas em Nova Iguaçu e Queimados. (Fotos: Marcelle Decothé)

A chacina fez 29 vítimas em Nova Iguaçu e Queimados. (Fotos: Marcelle Decothé)

Dez anos depois da Chacina da Baixada, mães, parentes e amigos das vítimas se reuniram para um tributo. Em 31 de março de 2005, onze policiais militares insatisfeitos com as mudanças de comando de diversos batalhões se reuniram em um bar e planejaram uma vingança. A chacina, que é a pior já registrada no Estado, assassinou 29 pessoas e alterou definitivamente o cotidiano das famílias dos mortos e dos moradores dos municípios de Nova Iguaçu e Queimados.

Mesmo após tanto tempo, o clima ainda é de comoção  e revolta. Os participantes da passeata carregavam flores brancas e cartazes que pediam paz e justiça. Organizações como o Com Causa e o Fórum Grita Baixada integraram o evento, que começou na Avenida Presidente Dutra e fez paradas estratégicas nos locais onde as vítimas foram encontradas.

Segundo Luzia Moura, mãe de Sandro Vieira, que tinha 16 anos quando foi assassinado, o ato de paz acontece desde o primeiro aniversário da chacina, mas mobiliza cada vez menos pessoas. Ela contou que os processos judiciais pela morte de seu filho estão resolvidos, mas mesmo assim contesta o trabalho da Justiça. “Sobre o Estado já está tudo certo, o que me indigna é saber que foram onze assassinos que participaram do crime, mas somente cinco deles foram condenados. Por causa desta impunidade que eles continuam matando. Enquanto estou aqui, eles estão matando. Para mim a matança pior é dos policiais, eles que eram para dar o exemplo. A polícia não está preparada para isso”, indigna-se.

“Morrem dois, três por dia onde eu moro” 

O promotor Marcelo Muniz explica que os policiais denunciados têm diferentes graus de participação nos crimes, por isso receberam penas diferentes. Cinco foram condenados, mas apenas quatro estão presos. Fabiano Gonçalves Lopes, acusado de formação de quadrilha, cumpriu sete anos e agora está livre; José Augusto Moreira Felipe, Carlos Jorge Carvalho, Júlio César Amaral de Paula e Marcos Siqueira Costa foram condenados por homicídio qualificado com penas que variam de 480 a 559 anos de prisão e cumprem pena em Bangu. Os outros foram absolvidos.

Silvânia não nutre mais esperanças de dias melhores

Silvânia não nutre mais esperanças de dias melhores

Silvânia Azevedo, irmã da vítima Renato Azevedo, fala que em dez anos o sentimento que resta é o de indignação. Sua família ainda tenta se recuperar da tragédia, mas a tarefa não é fácil. Eles não têm mais esperança de que a atual situação da Baixada melhore, já que os índices de homicídios da região continuam aumentando. Segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), só em fevereiro de 2015 foram 32 homicídios dolosos registrados em Nova Iguaçu. “A caminhada não muda nada. Mudança da violência? Com certeza não. A gente faz caminhada pedindo paz, mas ela não chega. Não dá para acreditar que violência vai acabar porque a gente está aqui se manifestando”.

Ela diz ainda que os números não alarmam porque a contagem é realizada isoladamente. “Pode não voltar a acontecer uma chacina como a de 2005 mas, se for contar, morrem dois, três por dia onde eu moro” revolta-se, afirmando ainda que o único apoio que a família recebe é da ong Com Causa, que oferece atendimento psicológico para os envolvidos na tragédia. “Temos apoio psicológico deles pra não ficar tão maluca”, enfatizou.

Ongs apoiam famílias

Desde 2007 a Com Causa, acompanha de perto os familiares e amigos das vítimas da chacina. Fernanda Torres, articuladora da entidade, ressalta a importância da aproximação em casos deste tipo para que sejam garantidos a defesa e a promoção da cultura de direitos, que ainda é deficiente na Baixada.

“A Luciene Silva (mãe da primeira vítima da chacina, Raphael Silva Couto, de 17 anos, uma das lideranças da caminhada) transformou a dor em luta, isso é um exemplo para nós. Estamos aqui pra dizer para sociedade que nós não vamos nos conformar, por mais que a impunidade ainda exista.”

Alexandre Paiva, presidente da Com Causa, fala do trabalho da entidade. (Foto: Agência Brasil)

Alexandre Paiva, presidente da Com Causa, fala do trabalho da entidade. (Foto: Agência Brasil)

O presidente da entidade, Alexandre Paiva, explica que um dos motes da organização é que antes mesmo que as famílias procurem ajuda, eles se adiantam em estar disponíveis para oferecer orientações sobre direitos, já que na maioria das vezes os moradores destas áreas têm um sentimento de impotência diante da Justiça.

Ele comenta que esse trabalho minucioso contribuiu, inclusive, para o crescimento da militância na Baixada. “Percebemos que nesses anos de caminhada na Com Causa dentro da questão dos direitos humanos, nos lugares onde há um escritório com advogado, psicólogo, assistente social, muita vezes não conta com a adesão das pessoas que realmente precisam. A gente decidiu ir até eles nessas situações mais delicadas. Daí você fala como pessoa, coloca a mão no ombro dela, olha no olho e diz que se ela precisar a gente tem todo um aparato e profissionais, aí quando a pessoa decide vir nós já estamos aqui”, explicou.

A passeata começou na Avenida Presidente Dutra, passou pela Rua Gama, onde nove vítimas morreram, seguiu pela Rua Geni Saraiva até a “curva da morte”, local onde a matança terminou.

Música como forma de expressão

Batalhando por dias melhores na Baixada Fluminense, o rapper Dudu Morro Agudo, morador de Nova Iguaçu, compôs um rap relatando os problemas da Baixada e clamando por paz na região.

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