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Literatura que usa a favela como cenário

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A 3ª Festa Literária Internacional das Periferias (Flupp) terminou no domingo (16), homenageando o centenário de Abdias do Nascimento e com uma vasta programação para todas as faixas etárias. Junto com a festa, nasceu a esperança de conhecimentos e horizontes novos para crianças e jovens de escolas públicas da favela da Mangueira, Zona Norte do Rio, que visitaram o evento.  Quase 1000 crianças da Escola Tia Neuma Gonçalves curtiram a festa da leitura. A ideia é formar novos leitores, aproveitando sempre para conquistar as comunidades em que se instala a Flupp.

NFotos: Sol Mendonçao terceiro dia do evento, mais de 100 adolescentes assistiram à mesa “A voz da periferia”, com os escritores Otávio Junior, conhecido como Livreiro do Alemão, e Jessé Andarilho, morador da favela do Antares, Zona Oeste do Rio, autor do romance “Fiel”.  Os dois colegas falaram sobre sua relação com o leitor, a leitura e a escrita de histórias ambientadas na favela.

A favela está em cena
A Sala Sankofa foi o palco para um bate-papo entre Otávio Junior e Jessé Andarilho. A conversa entre os dois escritores da periferia carioca foi mediada pelo professor José Luiz Goldfarb, especialista em programas de incentivo à leitura. Eles falaram dos desafios e dificuldades que enfrentam e do orgulho e da responsabilidade que sentem por serem referências para as crianças e os jovens das favelas onde nasceram e foram criados.

Em comum, eles têm a idade: 31 anos. E também a vontade de dar voz e vez às favelas. Querem, antes de tudo, colocar o livro no imaginário popular. Os caminhos trilhados por ambos são bem diferentes. De fala rápida e linguagem totalmente afinada com os adolescentes da plateia, Jessé Andarilho não tenta parecer o que não é: “Eu era o terror da escola. Repeti a 7ª série 5 vezes”, diz, sem desmentir a brincadeira. Seu romance “Fiel”, recentemente publicado pela editora Objetiva, foi todo escrito no celular, durante as viagens de trem que fazia para atravessar a cidade rumo ao trabalho.

Como explicou, depois de ler livros escritos por amigos começou a dizer para si mesmo: “Também tenho histórias pra contar! Escrevi o meu livro como se eu estivesse contando aquelas coisas para alguém pelo bate-papo do Facebook. Voltei minha vida pra isso. Em qualquer evento sobre literatura, eu estava no meio. Mostrei pro Celso Athayde porque eu sabia que ele tinha contatos. Acho que eu estava no lugar certo e na hora certa”, acredita.

Jessé sabe que tudo aconteceu muito rapidamente e diz que o que mais gosta é ver o garoto da favela onde mora correr ao seu encontro para dizer que adorou seu livro. Como tudo o que conquistou, o futuro reserva uma nova realização: a Biblioteca Marginow, que terá somente livros de autores de periferias. Um dos aliados do projeto é o poeta paulistano Ferréz. Além disso, já entregou para a editora seu próximo romance ‘”Efetivo Variável”, escreve outras histórias e torce para o para que “Fiel” vire filme.

Além de autor de literatura infantil, Otávio Junior é um conhecido promotor e mediador de leitura. Seu projeto “Ler é 10” funciona na Biblioteca Parque Estadual do Alemão e tem um acervo de mais de dois mil títulos. Conhecido como Livreiro do Alemão, ele conta que quando era criança, queria mesmo era ser jogador de futebol, mas foi a literatura que o permitiu realizar seus sonhos: “Quando inseri o livro na favela, o Alemão saiu das páginas policiais e entrou nas páginas culturais. Fui um dos precursores da literatura de periferia no Rio”, garante.

Morador da Vila Cruzeiro, Zona Norte, encontrou um livro no lixo ainda menino e, como ele mesmo diz, se apaixonou por histórias. Decidiu que queria ser escritor e foi à luta: “Foi uma batalha muito grande”, admite. Hoje, depois de três livros publicados e dois prêmios ganhos (Faz Diferença, do jornal O Globo, e Orgulho do Rio, do jornal O Dia), Otávio é convidado para dar palestras, autógrafos em feiras de livros e para representar o Brasil em festas literárias no exterior.

Diversidade deu o tom da Flupp

Foto: Raphael KhalebOs alunos da Escola Tia Neuma passaram as manhãs e as tardes da última semana recebendo uma dose extra de cultura e de civismo. Participaram de oficinas de desenho na Sala Sankofinha, assistiram a documentários e puderam aprender um pouco mais sobre a importância do respeito e do amor ao próximo, independentemente da sua origem, raça ou religião.

Para a diretora da escola, Márcia Moura, a ida de seus alunos à Flupp teve como objetivo ampliar a leitura, a escrita e as percepções visuais dos alunos: “Quero incentivar as crianças pelo gosto das artes e cultura do nosso país. Tentamos resgatar um futuro para nossas crianças, tirá-los da marginalidade das suas comunidades e dar um modo de vida diferente do que eles convivem no dia-a-dia”. A diretora acredita que, ao ver tantas pessoas com acesso à leitura e ao prazer de ler, as crianças se entusiasmam em adquirir esse hábito tão importante para o crescimento.

Foto: Raphael KhalebNo que diz respeito ao incentivo à leitura, Marcelo Reis, coordenador da Escola de Artes Técnicas Luiz Carlos Ripper (EAT), sede da Flupp na Mangueira, é categórico: “Temos que começar a mudar o olhar das crianças, oferecendo a elas literatura, teatro e informações de como uma sociedade pode ser mais respeitosa e amável. Por isso, agradecemos e motivamos demais a vinda das crianças”. Para completar, ele citou a importância da patrona da escola, Tia Neuma: “De uma maneira singular, ela atendia a todos e ajudava na educação da comunidade da Mangueira. Projetos culturais, como a Flupp, deixam a esperança de um futuro melhor, onde não podem faltar o hábito da leitura e a busca de novos conhecimentos”, finaliza.

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