Bissexual*, sim senhor
“Por diversas vezes, as escolhas que fazemos ao longo da vida acabam refletindo no nosso dia a dia. Quando assumimos o que somos e o que queremos, nossos desejos mais profundos são transformados em realidade e é isso que vai fazer de você a pessoa mais feliz do mundo”.
É com essa frase que Carine Silva, moradora de Manguinhos, expõe seu pensamento sobre sua orientação sexual. Ela é uma jovem (21 anos) operadora de telemarketing no Centro do Rio de Janeiro, muito decidida e cheia de vontade de conscientizar o mundo de que a bissexualidade é uma escolha como qualquer outra, e que, quando feita com sinceridade, proporciona o melhor da vida.
“Aos 13 anos conheci uma menina na escola. Ela já era bissexual, mas ninguém sabia. Seus pais eram católicos e tinham até cargo na igreja. Isso fez com que a ela se sentisse reprimida por anos. Eu estava muito curiosa pra saber como era ficar com meninas e acabei gostando dela, mas não tive coragem de falar. Quando fiz 15 anos, não consegui mais esconder a vontade. Falei tudo o que sentia mas ela não correspondeu. Fui ficando com meninos, até que tive a minha primeira experiência sexual com uma mulher aos 18 anos”, revela.
Carine teve o mesmo problema que sua amiga. Seu pai, o pastor evangélico Antônio Silva, de 57 anos, não via com bons olhos esse “tipo de coisa”:
– Eu comentava sobre a bissexualidade na igreja, sem imaginar que dentro de casa tínhamos alguém com esta escolha. Não posso condenar, mas não acredito que esse seja o caminho certo. Porém, cada um faz aquilo que bem entender.
A psicóloga Ivanir Santos diz que “a pressão sofrida por conta da religião é algo que pode atrapalhar muito o desenvolvimento do indivíduo, principalmente quando a família também não aceita”. Ela ainda faz um alerta em relação à idade com que as pessoas estão “se descobrindo”: “Hoje é comum que um adolescente de treze anos já faça suas escolhas, principalmente sobre sexualidade, que é algo que nos acompanha desde o nascimento. Essa idade é uma fase onde se fantasia muito, porém, também é uma fase de descobertas. É preciso conversar e expor as ideias”.
Marcelo Cavalcanti tem 29 anos e é morador de Ramos. Ele conta como foi sua experiência ao contar para sua família sobre sua orientação sexual. “Com 19 anos comecei a namorar um rapaz de 30. Eu estava muito feliz mas faltava algo. Percebi que o que me limitava era meu próprio medo. Conversei com meu pai e minha mãe e, quando terminei de falar, eles me abraçaram e me deram total apoio para ser feliz”.
O caso de Marcelo mostra como aceitação e apoio são fundamentais para que a felicidade seja completa. Quando fala do medo que sentia, Marcelo se refere ao medo que tinha dos pais por conta dele ter uma namorada. Para ele, seus pais jamais entenderiam a situação. “Imagina, seu filho tem uma namorada há três anos e um belo dia resolve dizer que também tem um namorado. Isso causa um choque enorme na cabeça das pessoas, não é fácil compreender, mas também não é fácil assumir isso diante dos seus pais”, comenta.
A preocupação de Marcelo hoje é outra. O rapaz tem uma filha de três anos, fruto de um relacionamento que terminou há um ano. “A mãe da minha filha sabe que sou bissexual e sempre respeitou minha orientação. Quando ela engravidou, nos éramos namorados, então alugamos uma casinha e fomos esperar pelo nascimento da nossa filha”. Entre idas e vindas, o tempo foi passando até que o relacionamento acabou. “Mesmo estando com minha companheira, eu ficava com um rapaz. Ele frequentava nossa casa e nunca houve conflito por conta disso. O fim se deu por uma questão de afinidade mesmo”.
Para Marcelo, a maior dificuldade será contar para sua filha sobre sua orientação. “Esse momento vai chegar, vou me abrir com ela no momento certo, mas confesso que não será simples. Tenho medo, novamente a insegurança me rodeia, mas ela vai acabar entendendo”.