Jardim suspenso no Arará
A casa do sonoplasta e videomaker Luiz Cassiano, também conhecido como Careca, virava uma sauna no verão carioca. Há dois anos, ele decidiu fazer uma intervenção onde mora, na tentativa de reduzir a temperatura dos cômodos. A primeira experiência deu errado. Ele não se adaptou ao ar condicionado. A alternativa para melhorar o microclima da casa foi encher o telhado de plantas. Sua biocobertura chama atenção em meio às construções de alvenaria da favela do Arará, em Benfica, Zona Norte do Rio.
“Minha casa ficou mais fresca. A temperatura caiu 15 graus”. Careca percebeu ainda que, após a instalação de telhado verde, diminuiu a presença de mosquitos e aumentou a freqüência de borboletas – o inseto é um excelente indicador da qualidade ambiental. Ele colocou plantas sobre a telha de amianto e criou um sistema próprio de irrigação. O terraço também foi povoado de plantas, entre espécies medicinais, cactáceas e plantas insetívoras. A criatividade do sonoplasta foi além do cultivo em ambientes tradicionais, como os vasos. Ele deu novos usos para os objetos do dia a dia. Há mudas crescendo em sapato velho e guitarra aposentada.
O telhado verde de Careca foi instalado inicialmente de forma rudimentar, sem nenhuma técnica. Ele apenas preencheu os espaços das telhas de amianto com terra e fincou raízes aleatoriamente. Algumas plantas foram doadas, outras recolhidas do lixo da Cadeg, o mercado municipal próximo a sua casa. Sua ideia foi aperfeiçoada em julho último, com a ajuda de um amigo, Bruno Rezende, que todos chamam de Bromélio. O replantio foi feito dando prioridade a plantas de espécies mais resistentes ao calor.
“As plantas amenizam o estresse. Eu não planto, eu faço terrapia. As pessoas deveriam tentar mais lidar com as plantas. Iam sentir a diferença não só no ambiente, mas nelas mesmas”, filosofa Careca.
Inovação e baixo custo
Formado em Biologia e doutorando em Engenharia Civil pela Coppe da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a tese de Rezende é sobre sustentabilidade em edificações. Sua casa em Niterói foi construída com base nesses princípios, mas a técnica foi aperfeiçoada ao longo do doutorado. “O novo processo reduz o custo da instalação por metro quadrado, fazendo com que o preço caia cerca de 40% em relação ao que é hoje praticado no mercado”, calcula o biólogo. Outra vantagem é não usar solo ou substrato, o que perrmite, diz ele, que o telhado seja instalado em qualquer tipo de cobertura:
“Por ser uma técnica que não utiliza substrato, só o sistema hidropônico, o enraizamento das plantas ocorre no tecido. Não tem solo. Por isso, permite apenas a utilização de plantas que estão naturalmente adaptados aos locais de muita iluminação, muito vento, e pouco solo. As melhores opções são espécies das famílias: alcantarea, bromélias de sol, callisia, cactáceas e cereus.
O projeto foi desenvolvido para ser aplicado na área urbana, com vegetação oriunda de ambientes rochosos, que sobrevive em solo raso com pouca água. As espécies crescem de forma horizontal, facilitando a limpeza do espaço. O telhado verde idealizado por Rezende ainda contribui para a absorção de poluentes do ar, reduz as ilhas de calor e promove economia de energia elétrica.
Rezende conseguiu financiamento junto ao Coppe para implantar sua técnica experimentalmente e Careca foi o maior beneficiado. Ele só está esperando sua tese de doutorado ser aprovada para patentear sua inovação. “A ideia é instalar em larga escala na cidade, tanto em comunidades de baixa renda quanto em edificações residenciais e comerciais, porque as vantagens do telhado verde são imensas”.
O teto verde é uma metáfora da sustentabilidade. Além de diminuir significativamente a necessidade de energia para climatização dos ambientes, o eco telhado ajuda na redução das emissões dos gases de efeito estufa, especialmente o gás carbônico (CO2). Ainda que pareça um fenômeno da modernidade, os jardins suspensos surgiram na Antiguidade. Foi a crescente degradação ambiental e o rápido declínio das áreas verdes que ajudaram a ressuscitar as coberturas verdes, especialmente a partir dos anos 1960. Atualmente, países como Suíça, Áustria, Grã-Bretanha, Hungria, Holanda, Suécia e Estados Unidos adotam políticas públicas para estimular a instalação de biocobertura nas construções urbanas.