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Portões ilegais dividem Vila Kennedy

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Fotos: Isabele AguiarA crescente sensação de insegurança que assola a cidade do Rio de Janeiro tem levado moradores a providenciarem, sem a intermediação do poder público, medidas de contenção da violência em seu bairro. Nas ruas de Vila Kennedy, o fenômeno se traduz na proliferação de portões de segurança que controlam o acesso a casas e comércios. A intenção é oferecer maior proteção aos residentes, embora o 14º Batalhão da Polícia Militar esteja logo ao lado. A iniciativa vem, no entanto, dividindo moradores e comerciantes. Das 27 ruas do Conjunto Quafá, um dos sub-bairros da Vila Kennedy, sete já têm portões.
Segundo os moradores, as barreiras servem principalmente para inibir a ação de bandidos e de motociclistas que passam em alta velocidade no local, colocando em perigo a vida das crianças que brincam na rua. Há quem também alegue que o número de assaltos a residências cresceu no último ano, apesar dos dados do Instituto de Segurança Pública (ISP) indicarem que apenas seis ocorrências deste tipo foram registradas pela 14º Delegacia de Polícia em todo o ano de 2013 (os dados de 2014 ainda não foram disponibilizados).
A cabeleireira Merian Souza tem quatro filhos – e por isso apoia a instalação de portões para proteção das crianças. “Sou a favor sim, por um pouco mais de segurança, até porque passam muitos doidos de moto que nunca vi, numa velocidade sem necessidade, isso com crianças na rua brincando. Fora que acaba um pouco com certas rotas de fuga, pois com portão será mais fácil para os policiais perseguirem esses indivíduos”, acredita.
As opiniões divergem. Enquanto a corrente que preza por segurança faz coro para instalação de mais portões por todo o Conjunto, há dezenas de moradores insatisfeitos. “Quando o assunto ainda era especulação sobre o portão, minha família e alguns vizinhos não foram a favor. Depois, descobrimos que já haviam ocorrido algumas reuniões sem qualquer diálogo conosco, e que algumas decisões já até haviam sido tomadas. A única comunicação foi quando vieram com um papel dizendo que os custos da instalação sairiam em torno R$250 por família. Quem não aceitasse, não teria a chave do portão eletrônico, somente a chave comum”, explica a paisagista Paloma Oliveira, referindo-se a sua rua, que foi fechada há aproximadamente 15 dias. “De lá pra cá as visitas que recebo têm que estacionar os carros na outra rua e aqui se transformou em um salão de festas”, reclama.
Já Claudemir Umbelino, dono de uma confecção que existe há mais de 20 anos na Rua L, alega que anda tendo prejuízo e que suas vendas caíram consideravelmente desde que o acesso ao seu comércio passou a ser regulado pelo portão. “Eu seria a favor se fosse feito de uma maneira organizada e legalizada. Se fizessem de fato um condomínio nos acessos ao conjunto tudo bem, mas estão fazendo tudo de qualquer jeito, e não comunicam a todos os moradores as reuniões. Fiz um recibo com o valor da colaboração para o portão, mas os organizadores se negaram a assinar”, afirma o comerciante.
A instalação dos portões tem sido feita à revelia, sem autorização dos órgãos governamentais. Os Decretos Municipais 14.618/96, 14.703/96 e 23.084/2003 tratam do fechamento de logradouros públicos e estabelecem que, para instalar qualquer mecanismo de controle de pessoas nas ruas públicas, são necessários alguns trâmites, como permissão da Subprefeitura local, encaminhamento para a Secretaria de Urbanismo, seguida da Secretaria de Obras e Conservação e publicação no Diário Oficial. Segundo a chefe de gabinete da subprefeitura da Zona Oeste, Gabriela Gomes, este processo “pode demorar até um ano para ser concluído.” A subprefeitura também afirmou que o maior número de reclamações deste tipo na região provêm de Bangu.
Ausência do Estado é principal fator
A antropóloga Bianca Arruda enxerga que este é um fenômeno que tem ganhado força principalmente na Zona Oeste e atribui a questão à ausência de políticas públicas básicas, principalmente as relacionadas à segurança. “Nessas comunidades os serviços essenciais geralmente não chegam, então os moradores têm que procurar artifícios para driblar essas adversidades. Porém é inevitável que, depois deste fenômeno, surjam novos proprietários e novas lideranças difusas para encabeçarem as decisões. O cenário que se estabelece depois pode ser o mais problemático”, observa.
Enquanto nos bairros mais centrais da cidade a tendência é derrubar barreiras e priorizar áreas abertas para a circulação de pedestres, as comunidades fora da rota dos megaeventos acabam entrando na contramão desta lógica, segundo explica Alex Magalhães, professor de Direito Urbanístico e Ambiental do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (Ippur). Ele acredita que acontecimentos deste tipo são bastante comuns em contextos como o que Rio de Janeiro vive atualmente. “Não surpreende que em cidades repletas de formas de privatização de espaços públicos (fechamento de ruas, loteamentos fechados, grandes condomínios, etc.) os segmentos empobrecidos comecem a desejar o mesmo” pondera. O professor frisa também que a precariedade da segurança pública em favelas e bairros é um fator agravante para esta tendência.
Em paralelo à discussão que tomou conta do bairro, uma ação espontânea surgiu nas redes sociais através dos moradores que se opõem aos portões. O movimento #NãoVaiTerPortão começou no Facebook e a hashtag foi pintada no chão da Rua Z, que vive o auge da polêmica. A foto está sendo compartilhada por pessoas que compactuam com a ideia.
A Prefeitura informou que a retirada de obstáculos ilegalmente instalados é realizada através do telefone 1746

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