Busca a Amarildo vira luta por “Amarildos”
A pauta da próxima manifestação pela localização do pedreiro Amarildo de Souza, sumido há 15 dias, abrangerá outros desaparecimentos de moradores de favelas. O novo protesto está marcado para quinta-feira, dia 1º, e começa às 17h30 na passarela da Rocinha. A decisão de estender a luta a outros casos de desaparecidos em comunidades surgiu em reunião, dia 27, da família do pedreiro com entidades como Coletivo Alemão, Redes Contra a Violência e a TV Tagarela.
Como noticiou, na quarta-feira, o Blog da Redação Viva Favela, Amarildo pertence a um grupo socialmente exposto ao risco de desaparecimento. De acordo com dados do Instituto de Segurança Pública do Rio de Janeiro (ISP), em 2010, a maior parte dos desaparecidos tinha ensino fundamental incompleto (40,5%), pertencia ao sexo masculino (59%) e era de cor parda (42,2%). Assalariados de nível médio compõem o segundo grupo com maior número de desaparecimentos por ocupação (19,3%), atrás apenas dos estudantes (27,4%).
Levantamentos do ISP mostram ainda que 5.488 pessoas desapareceram em 2011, o que representa um aumento de 0,3% (15 pessoas) em relação ao ano de 2010. Este número torna-se ainda mais expressivo quando comparado aos indicadores do IBGE: de acordo com o último censo de 2000, 1.382 municípios brasileiros têm menos de 5.000 habitantes. Ou seja, os registros do ISP evidenciam que, no estado do Rio de Janeiro, desaparece anualmente o equivalente à população de uma cidade brasileira. Entidades de direitos humanos alertam que dados oficiais não contemplam parte considerável dos casos, podendo ser parciais. Valéria Medeiros, comunicadora comunitária, relata que sumiços acontecem diariamente nas favelas da cidade envolvendo, muitas vezes, instituições públicas – Amarildo, por exemplo, foi visto pela última vez ao ser chamado para uma “verificação” na UPP da Rocinha.
Para Alice de Marchi, pesquisadora da ONG Justiça Global, o desaparecimento de pessoas em favelas não pode ser dissociado da história e das práticas da ditadura instaurada em 1964. “As práticas que levam ao desaparecimento, em ambos momentos históricos, são semelhantes, envolvendo seqüestro, tortura e muitas vezes assassinatos”, acrescenta Alice.
Além de estender a luta aos “Amarildos”, na reunião de sábado decidiu-se unificar as páginas do Facebook dedicadas à causa dos desaparecimentos. A nova página “Onde estão os Amarildos” será administrada pela família do pedreiro da Rocinha. Foi decidido também que haverá tentativa de transformar o protesto de quinta-feira em evento nacional.
Os participantes da reunião de sábado convidaram os manifestantes a relembrar demais casos de violência, como as chacinas de Acari, Candelária e Vigário Geral. Até hoje não foram encontrados os corpos dos onze jovens de Acari, que sumiram em julho de 1990. O inquérito não foi concluído, segundo o Ministério Público, por falta de provas. No entanto, as “mães de Acari”, como ficou conhecido o grupo que lutou pela apuração do desaparecimento dos jovens, afirmam até hoje que não faltam relatos de pessoas que provem o envolvimento de policiais nas mortes.
Fábio Eduardo Soares Santos de Souza, Rodrigo Abílio, Leandro Neves e Danielle Gonçalves são alguns outros nomes de pessoas que desapareceram em favelas e cujo desaparecimento estaria ligado, de acordo com famílias e amigos, à violência policial. Em nenhum desses casos o inquérito foi concluído.